segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

O velho e o novo

O velho sonhou tornar-se novo, os dias passaram e de tanto persistir enfim tornou-se novo.
Insatisfeito, o novo tentou tornar-se só, sem amor, sem carinho, sem atenção, sem aquela canção, sem o cafuné. Ora! Se é novo, tem de ser diferente, revolucionário, impulsivamente errado, isso mesmo errado! E colocou em prática sua magnífica ideia de solidão.
Lá de longe, tão distante quanto uma luz no fim do túnel, estava o velho; triste decepcionado ao ver que seu futuro estaria arruinado por tamanho egoísmo do novo. Mesmo de longe senti um aperto, como um grito, uma lágrima. A dor do velho viria a tona? Desabrochara em mim?
O velho, com seus apítos e foguetes e bandeiras coloridas tentou de todas as formas chamar a atenção, mas eu estava distraída!
Quanta injustiça subestimá-lo, viveu tanto, aprendeu, sabe o que é amor, o carinho, a atenção, sabe cantar aquela canção, sabe fazer cafuné, sabe falar calmo, sabe ouvir, sabe entender. O novo ainda tem muito de aprender.
O novo caminhou por alguns dias dentro dos pensamentos meus; de tanto caminhar sozinho passou a falar consigo mesmo... uma metade insistiria na solidão a outra pedia pelo velho e seus ensinamentos.
Optou enfim pelo velho, que sentou ao seu lado e então ensinou-lhe a solidão, a solidão de ser só dois! "Não fique com toda essa solidão, aprenda a dividi-la com alguém."
Ainda hoje o novo não dorme tranquilo, parece-me que o velho um segredo esconde, não o deixa ser inteiramente "novo envelhecido"!
Dentro de mim é tudo tão certo, tudo tão completo, que assusta. Uma metade diz que é  primogênito, outra metade chora. Uma grande contradição, assim como  querer unir o velho ao novo! 


Venha sem chão me ensina
 a solidão de ser só dois
Depois te levo pra casa
Que o teu laranja é que 
me faz ficar bem mais

Maria Gadú



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